O melhor e mais odiado Series Finale de todos os tempos.
Se você ainda não leu a primeira parte do nosso especial sobre a temporada final de Lost, clique aqui agora mesmo.
Depois de estabelecer o recrutamento promovido por Jacob e Locke Fumaça, chegamos naquele ponto da temporada em que as coisas começam a ganhar uma plenitude de expectativas das quais seria praticamente impossível fugir… Lost, uma das produções mais inteligentes que já foram feitas para a televisão, manteve seus milhões de fãs sob um regime feroz de controle. Agora, nos últimos episódios de sua última temporada, tinha nas mãos o dever de começar a satisfazer as expectativas e cumprir aquele chamado coletivo por respostas. É claro que sempre vão existir aqueles que corroboram a virtude da simplicidade. Mas, esses não estacionaram na série certa. As respostas que Lost precisava dar começaram a ser dadas muito antes de chegarmos aqui… Eu desafio vocês a continuarem comigo nesse mergulho às lógicas da série na hora de seu derradeiro fim.
Na ilha, aquela ordem ligada ao destino continuava agindo veladamente. Cada uma das tentativas para destruir o avião da Ajiira era frustrada, sobretudo porque eles saírem dali num avião era como um fechamento cíclico dessa mesma ação do destino. Então, quando levar a dinamite pra ele foi uma possibilidade levantada, Ilana foi pelos ares em resposta. E olha a gente aqui, de novo, reprisando eventos dos primeiros anos que vão se correlacionando com o presente de uma forma catalisadora. Tudo estava pronto pra convergir.
Em The Last Recruit, vimos uma conversa incrível entre Locke Fumaça e Jack, em que o monstro fala abertamente sobre ter usado a imagem de Christian para manipular os sobreviventes que ele considerava aptos aos seus objetivos. E seus objetivos iam desde providenciar que eles encontrassem água (para não morrerem antes do previsto) até convencer o mais crédulo de todos de que havia algo especial a ser feito ali. Locke ficou com esse posto e acabou se relevando a escolha certa, porque foi ele quem acabou dando ao monstro o acesso à Jacob.
Essa conversa vai ajudando Jack a entender, aos poucos, que ali há realmente um trabalho a ser feito e que ele representa muito sacrifício e muita força. Isso confirma o ponto de vista de Jacob, que sempre quis que o substituto entendesse o que devia fazer e não fosse simplesmente ordenado a fazê-lo. Por causa da força desse momento, os roteiristas uniram pela última vez todos os sobreviventes principais e fizeram do episódio seguinte, The Candidate, uma grande peça de estabelecimento do que foi a série e de onde ela pretendia ir. E na época, houve uma certa confusão acerca de como funcionava aquela dinâmica de “pode ou não pode morrer”, que acabou sendo confusamente invocada por Jack naqueles minutos antes que a bomba explodisse nas mãos de Sayid.
O fato é que sim, na ilha, os candidatos podiam morrer como qualquer outra pessoa. A razão pela qual Jack não morreu no Black Rock com Richard é porque estava com Richard e era ele quem não podia morrer em nenhuma circunstância. No diálogo sobre a bomba, Jack berrava que eles não podiam morrer, mas estava errado e Sayid acabou salvando várias cabeças. Do outro lado, Locke Fumaça tentava proteger o avião (para que fugisse nele) e reunir todos os candidatos num mesmo ambiente, para dar cabo de todos de uma vez só. Além disso, a razão pela qual ele quer eliminar Desmond é muito simples: Desmond resistiu a exposição à energia eletromagnética de um jeito menos cruel do que o próprio Homem de Preto e representava um risco para os planos dele. Se Desmond resiste, ele pode entrar, desplugar e tornar vulnerável o produto daquela força.
Acho esse episódio extremamente forte, emocional e totalmente digno de uma temporada final. Digam o que quiserem sobre a força do minimalismo da teledramaturgia atual, mas uma boa final season é feita de grandes encontros, viradas repentinas, convergência de eventos e mortes. The Candidate foi um episódio que trouxe tudo isso pra roda. Incluindo as mortes de Sayid e o reencontro de Sun e Jin depois de um tempo imenso separados, apenas para morrerem afogados menos de 24 horas de terem se reencontrado. O momento em que Hurley, Kate, Sawyer e Jack chegam na praia e têm consciência daquela perda, está entre os mais bonitos do programa.
E então, chega a hora de falar de Across the Sea…
Lembro bem de como esse episódio foi recebido… Eu mesmo fiquei estático em frente à TV por muito tempo. Foi devastador… Pra mim, no melhor dos sentidos. Era exatamente o que eu queria… Que os roteiristas não fizessem dessa ação passada um monólogo na boca de um personagem, mas que pudéssemos ver tudo acontecer, que pudéssemos montar o quebra-cabeças sozinhos, como Lost sempre fez e como era mestra em fazer. De fato, os grandes erros desse episódio foram nos momentos em que explicou demais, mostrou demais.
Para termos uma compreensão aproximada dele, é necessário trazer aqueles signos bíblicos que estão no centro dramatúrgico da série desde sempre. Comecei falando de Éden nesse texto, não só porque as pesquisas apontam para essa brincadeira, mas porque essa é a essência proposta. E em Across the Sea ela é confirmada. Não se pode esquecer que o primeiro casal que habitou o paraíso deu a luz a dois meninos… Caim e Abel… Um claro e outro escuro… Um é a servidão nata e o outro, o mal nato. O mal que é descrito pelas escrituras sempre em forma de questionamento e inveja. Lúcifer foi expulso porque duvidou e Caim matou porque teve cobiça e inveja.
Na ilustração do Wikipédia sobre os dois irmãos, surpreendentemente, vemos Caim levando Abel para a morte, pelas mãos, vestindo preto. Qualquer semelhança com Jacob levando O Homem de Preto pelas mãos, até a fonte de energia, não é mera coincidência. De fato, só é mais genial, porque Lost propõe, momentaneamente, uma troca de papeis, com Jacob-Abel condenando o irmão a uma “morte” não consumada e eterna (exatamente como Deus faz com Caim).
Então, para que tudo isso vá se esclarecendo, vale colocarmos alguns pontos de Across The Sea em perspectiva:
Dois meninos – Duas mantas, uma clara e uma escura – Tudo tem dois lados: A civilização é incapaz de viver sem equilíbrio. Para haver o bem tem que haver o mal e as duas coisas podem ser assustadoramente natas.
(a mãe vê em Claudia uma chance de ter seu substituto, mas os bebês representam uma forma segura de condução da ideia de que algo precisaria ser protegido)
Walt ouve: Você é especial.
O Menino de Preto ouve: Você é especial.
Ambos tem uma ligação estranha com essa noção de mal nato. Dai parte minha teoria de que Walt precisaria voltar para ilha para manter o equilíbrio.
Quando pessoas chegam até a ilha, a mãe precisa apressar a catequese dos meninos e ao mostrar a “luz” pra eles, oferece a única explicação que era possível ser dada.
ÚNICA EXPLICAÇÃO POSSÍVEL DENTRO DO CONTEXTO HISTÓRICO DAQUELA ÉPOCA: Me impressiona que até hoje as pessoas exijam da personagem uma explicação clara sobre o que era aquilo… Aquela mulher vivia num tempo distante de qualquer ferramenta intelectual esclarecida. Assim como ruivas um dia foram eleitas bruxas por falta de esclarecimento, a mãe não podia dizer para os filhos que aquilo era uma fonte de energia eletromagnética muito poderosa que poderia alterar o tempo e até mesmo a fisiologia. Ela usou a metáfora que foi possível e o que importava era que o efeito fosse o mesmo. Assim, vou dizer em negrito porque acho que o momento merece: Toda aquela explicação sobre “ o mal que não pode escapar” ou “a luz especial precisa ser protegida do homem” era coerente com o contexto daquela personagem, mas não era a verdade lógica, era apenas uma verdade intuitiva.
O Homem de Preto para Jacob: Um dia você vai ter seu próprio jogo e vai poder criar suas próprias regras.
Questionador, a versão menino do Homem de Preto não sabe que tem o talento de ver mortos, como Hurley, e essa habilidade, de forma genial, vai virar outra coisa assim que ele for exposto à energia.
[Damon e Carlton não conseguem proteger a trama toda e frases como “um sistema que estamos construindo (sobre a roda)” e “sei por que sou especial”, acabam não embasando totalmente a trama]
Como estamos falando que Lost misturava mito e ciência, embora a caverna fosse a porta para o bolsão de energia, a forma como ela é encontrada ou como seu guardião é escolhido, tocam no campo da flexibilização da fé, algo natural e NECESSÁRIO em qualquer trama de ficção científica ou fantasia. Fica claro que era necessário ter um tipo de autoridade mística para ser capaz de achar a caverna. A mãe leva os meninos pelas mãos e logo depois, quando Jacob o faz com o irmão, já é como novo guardião.
A questão toda é que a mãe escolheu Jacob porque ele era o mais correto, e manipulou o outro para que ele a matasse logo depois da transferência, para que com isso ela encontrasse o fim que tanto almejava. No intuito de cumprir o plano, ela não deu ao filho de branco a escolha. Ele foi compelido. EXATAMENTE por isso, toda a postura de Jacob se tornou velada, articulada no sentido de dar ao substituto a chance de escolher ficar. Isso, é claro, atrasou todo o processo mais ainda, porque, no respeito à ordem do equilíbrio, o Homem de Preto/Lucifer/Caim, também podia planejar sua intromissão. Por isso, Jacob recrutou Richard e organizou sua ligação com os Outros numa tentativa de facilitar a ponte entre ele e aqueles que seriam escolhidos.
Desculpem-me os céticos, mas quando olho para esse panorama todo, só fica mais claro pra mim o quanto Lost é absolutamente SENSACIONAL.
Tivemos os mais puristas, reclamando que a cena dos esqueletos da primeira temporada sendo relembrada aqui, foi uma “forçassão de barra para nos convencer que tudo estava planejado”. E daí? Não acho menos admirável que não estivesse e mesmo assim eles tivessem conseguido fazer parecer tão bem que estava. De fato, a experiência de Across The Sea pra mim é deslumbrante e nunca vou esquecer meu arrepio de emoção quando o monstro de fumaça voou pra fora daquela caverna. Televisão de primeira qualidade, senhores… De primeira qualidade.
Com o terreno preparado, o penúltimo episódio pôde lançar mão da narrativa pura e simples e colocou Jacob com seus candidatos numa rodinha para ter a conversa derradeira. E sim, agora ele pode fazer isso, porque eles já estão plenamente cientes do que foram fazer ali e do que a ilha representa. Então, ele diz que o trabalho não pode ser forçado, perguntando aos presentes quem gostaria de assumi-lo… Jack era a escolha óbvia, mas muito correta. Foi maravilhoso vê-los ouvindo como foram tirados de suas vidas porque nenhum deles tinha nada a perder, como Kate agora era mãe e por isso tinha sido riscada da lista, como eles precisavam passar por tudo aquilo para entenderem o valor daquela posição a qual concorriam.
Agora você é como eu”
Eu me lembro que na época em que o último episódio de Lost foi exibido, eu só tinha internet no trabalho. Naquela semana, especialmente, a conexão andava ruim e eu, que evitava pedir favores cibernéticos aos amigos e parentes, passei por cima desse protocolo pessoal e pedi a uma prima pra usar a internet dela e baixar o The End com mais rapidez, para que pudesse vê-lo logo no dia seguinte à exibição nos EUA. Seria inadmissível ter contato com a rede na manhã posterior e escapar de spoilers. Me senti péssimo por ter que ficar ali na sala dela esperando o download terminar, mas aquela era uma ocasião muito especial e merecia o sacrifício.
Cheguei em casa e o meu namorado na época estava fora. Sozinho, preparei o quarto, desliguei o telefone e permaneci por aqueles 90 minutos, imerso na atmosfera de despedida daquela série que tanto me desafiava e comovia, e que estava indo embora daquele jeito tão lindo… Sim, eu sou do time que AMA o final da série e que reconhece que aquele era o jeito mais honesto, sensível e grandioso, de terminar um projeto que tinha se tornado maior do que tudo que a televisão mundial propusera até ali.
Entendo, porém, que a explicação emocional para o que vimos na realidade alternativa, se chocou com as exigências práticas em torno dos segredos de Lost. A coisa toda era tão grande, havia tanta expectativa, que qualquer decisão teria provocado insatisfação de algum jeito. A questão é que Damon e Carlton não esperavam que uma parte tão grande da audiência fosse rejeitar a ideia de que entre destino, ciência e mito (grandes bases da dramaturgia), fosse acabar sendo o lado espiritual do show, aquele a ganhar o spot final.
A ideia em torno do episódio final era muito simples: ele revelaria que as cenas da realidade alternativa completariam um quadro de apelo a um conceito espiritual metafórico. Para cada um de nós, há um período da vida, muito especial, que é responsável por tornar nossa existência mais relevante. Seja o período da infância, da adolescência, uma viagem coletiva, um curso feito no meio da rotina, qualquer coisa. No meu caso foi uma peça de teatro, que por seis meses de ensaios, me manteve isolado do mundo, com mais 20 pessoas, numa troca de experiências, intrigas, egocentrismos e catarses, que marcou a todos nós de um jeito que mesmo que fiquemos anos sem nos ver, surge com força total na nossa memória quando nos reencontramos.
No caso de Lost foi aquele 22 de Setembro de 2004… Naquele dia, as vidas de todos que estavam no avião e na ilha, foram entrelaçadas e redirecionadas. Todas as experiências vividas durante aquele tempo foram carregadas pra sempre como o ponto maior do plano existencial e uma vez que a série tomou a liberdade de criar um plano espiritual, foi justamente a vida na ilha que reconectou cada um deles, buscando a compreensão dessas vivências e tudo que elas representaram. Para, só depois disso, seguir para esferas superiores, sejam elas quais fossem.
Sob essa perspectiva, cada um dos reencontros teve sua carga emocional certa… Damon e Carlton acertaram ao mostrar que alguns desses momentos não eram entre amantes, mas entre pessoas que se importavam umas com as outras. Juliet fez Sawyer lembrar, mas fez Sun lembrar também. Kate lembrou não por causa de Jack, mas por causa do momento em que Aaron veio ao mundo. Ao mesmo tempo, o reencontro de Sayid e Shannon foi muito forte justamente porque Lost sempre foi muito competente em estabelecer as ligações entre aquelas pessoas. E Shannon foi a mulher que Sayid amou dentro da ilha, por isso é que ela esteve no posto que muitos acharam que deveria ser de Nadya. Vale lembrar que a relação que Sayid tinha com Nadya era uma relação de redenção, de proteção. Além disso tudo, vamos combinar que será sempre lindo ver a expressão dos personagens quando eles lembravam do que tinham vivido e a forma terna que passavam a olhar para os que não tinham lembrado ainda.
Enquanto as conexões eram feitas na realidade alternativa, na ilha tudo ia se consumando do jeito mais coerente possível. Entendo as críticas ao que foi feito no plano paralelo, mas não consigo entender a insatisfação à forma como os eventos na ilha foram encerrados. Houve uma convergência absolutamente concisa de tudo que foi proposto até ali, com direito a tudo que um final épico tem que ter: surpresas, mortes, viradas inesperadas, confrontos grandiloquentes e muitas despedidas sentimentais.
Entendo, é claro, que existe um outro ponto delicado na flexibilização da nossa fé e que tem as mesmas fragilidades provocadas pela caverna de luz: o plugue dentro dessa mesma caverna. Minha teoria pra isso é a seguinte:
Ao aparecer em Across The Sea, a caverna parecia muito mais iluminada. Em The End, o plugue pode ser responsável pela moderação da energia. Essa não deixa de ser uma ideia correspondente ao botão na escotilha da segunda temporada: tudo era sobre aliviar a descarga de energia. Quando o roteiro leva Desmond até lá para retirar o plugue, está apenas provocando uma coesão dessa teoria. De novo, ele está sendo responsável por “descarregar” a ilha. Até mesmo a linda imagem dele sendo baixado por Jack e Locke Fumaça é parecida com a mesma que revelou o segredo no ano 2.
A retirada do plugue faz com que a água pare de correr na caverna. Bom, isso me faz pensar na água como condutora da energia, assim como é da eletricidade, uma vez que quando Jack recoloca o plugue, a água volta a correr e a luz se refaz. Considerando que há símbolos egípcios também dentro da caverna, podemos eleger o plugue como uma invenção daquela civilização, para, de alguma forma, amenizar os efeitos da energia perante as propriedades da ilha. Ou, o mesmo incidente que provocou a falha geológica que deu origem a escotilha, também pode ter ocorrido na exploração egípcia, sendo o plugue uma forma de agir sobre a fenda do mesmo jeito que o botão dos 108 minutos agia.
Esse momento em que Jack e Locke Fumaça descem Desmond pela caverna também é emblemático, porque é quando vemos Jack admitir que o verdadeiro Locke sempre teve razão quanto a ilha ser mesmo especial e que todos tinham parado ali por um motivo. Isso também estabelece a relação entre os dois de um modo sensacional. O homem de fé e o homem de ciência. Na ilha eles se chocam, na realidade alternativa, eles se complementam. Nunca houve um vencedor nessa rivalidade, justamente porque a própria ilha sempre funcionou lançando mão de toda essa ambiguidade. Foi um deleite pra mim ver as palavras saírem da boca de Jack, porque elas são uma outra bela e planejada convergência, feita sob medida para dar a início à ultima hora que eles passariam juntos naquele chão.
Ficou bem claro que Locke Fumaça não esperava que a retirada do plugue não só fosse destruir a ilha, como também eliminar todas as suas propriedades especiais. E fazia sentido… Sem a emanação da energia através dos lençóis subterrâneos, tudo que acontecia por conta desse contato eletromagnético foi neutralizado. Assim, o Homem de Preto reencontrou sua humanidade apenas para ter a morte que seria impossível em outra circunstância.
O confronto no penhasco foi maravilhoso… Últimas temporadas, últimos episódios, últimos confrontos, precisam mesmo ser grandes, épicos, regados de muita intensidade. E considero aquele céu nublado, a ilha desmoronando, um em cada ponta do penhasco, os dois rivais velados… Considero tudo isso como parte de uma nota certa dentro do planejamento desse fim. Desde o detalhe de vermos o corte no pescoço de Jack surgindo (depois de aparecer lá no teaser inicial), até o tiro dado por Kate e a forma como O Homem de Preto é lançado do penhasco da mesmíssima forma que lançou Jacob na fogueira. Aquele corpo estirado nas pedras, o mar revolto batendo e Lost honrando seu compromisso de ser grande, imensa, incomensurável.
Mal posso dizer como achei comovente o momento em que Hurley ganhou o posto derradeiro… Foi uma escolha tão sensacional. No meio de toda a luta de egos, ele realmente soava como o líder mais possível, ainda que quem olhasse pra ele não visse as coisas assim. O próprio Jorge Garcia, nos extras do box, recebe o roteiro final em casa e também se emociona ao ver como as coisas terminam. É muito interessante, porque a reunião que representa a ligação eterna na realidade alternativa, também existe na vida real. O que aqueles atores viveram enquanto estavam em Lost, foi maior do que tudo que já tinham feito até ali.
Então, Desmond manda um See You In Another Life, que agora, diante da realidade alternativa, ganha uma nova dimensão. Após passar o posto pra Hurley, Jack segue seu caminho até o bambuzal, transportado para fora da caverna como o Homem de Preto foi, enquanto seis sobreviventes correm até o avião da Ajiira, para fechar o ciclo e sair da ilha no mesmo veículo em que chegaram. Seis… Não vou me poupar de continuar dizendo que os criadores tinham muita, mas muita segurança do que estavam fazendo.
Oceanic Six Ajyira Six
Kate Kate
Saywer Sawyer
Jack Claire
Sun Richard
Hurley Miles
Aaron Lapidus
Acho incrível que Kate e Sawyer tenham sido tão fieis ao seu compromisso de sempre sobreviver, que Claire tenha ganhado uma nova chance, assim como Richard, e que Miles e Lapidus tenham restado como um compromisso do show com a atenção a núcleos que tiveram sua importância ainda que não tivessem começado com todos os outros. O avião corta a ilha pilotado pelo homem que devia ter pilotado o 815. Destino, ciclo, fechamento…
Então, temos dois momentos de muita força: o primeiro é entre Hurley e Ben do lado de fora da igreja. Ver como Ben evoluiu para aquele instante em que reconhece seu lugar e seu papel, sem vaidade, foi lindo. É apenas genial que Ben tivesse se tornado o novo Richard da ilha, aquele que realmente tinha uma ligação com quem dava as ordens. O outro momento foi a forma linda, mágica, com que a música de Michael Giachinno nos conduziu pela igreja, pela caminhada de Jack até o bambuzal, para Vincent deitando ao lado dele, seus olhos vendo o avião cruzar o céu e se fechando, encerrando a jornada mais impressionante de toda a história da TV. Não tem como descrever isso sem parecer pouco… É sobrenatural de tão forte, de tão sensível e de tão único.
Passei horas chorando depois da experiência desse fim… E sempre sinto a mesma emoção ao vê-lo de novo. Durante esses anos todos após o finale, todos os que, como eu, embarcaram no que Damon e Carlton propuseram, tiveram que enfrentar o escárnio com o qual a série foi tratada por “não ter dado respostas”, por “ter nos enrolado com respostas sentimentalóides”… O tempo todo, o final de Lost foi tratado por uma grande maioria como uma farsa. Alguns discordam… Me lembro que fui atrás de resenhas americanas e quase todas eram muito positivas. Até hoje encontro alguns que compartilham desse sentimento de plenitude. Mas, preciso admitir, a fatia de insatisfeitos é bem maior. Porém, o que esses textos comentando as temporadas quiseram, foi defender a série sob uma única perspectiva e a que considero mais injusta: Esse final não foi uma farsa. Ele pode não ter ido pelos caminhos convencionais, mas ele tinha embasamento, raciocínio, lógica e pode ser defendido em sua quase totalidade…
Durante os momentos mais críticos desse ataque ao Series Finale, eu nunca fui do coro que diz que quem não gostou é porque não entendeu. Sempre disse e vou repetir: esses textos não estão aqui pra dizer que eu gosto porque entendi mais. Não! Mas, tivemos dezenas de artigos na net detonando a série ao lançar mão de argumentos sob sua pretensa farsa. Acho justo que possa haver alguns que façam o oposto. Além disso, sempre achei que o problema nunca foram as respostas. Elas foram dadas, quase 100% delas foram dadas e as que não foram não eram necessárias. Em minha opinião, o problema foi de ordem emocional… E vejam que curioso, totalmente apoiados num instinto emocional, os detratores rejeitavam a abordagem que partia da emoção. Lost surpreendeu com um final escrito por pessoas que REALMENTE AMAVAM o que tinham criado, amavam cada um de seus personagens, que eram fãs como nós éramos fãs. Vocês nunca pararam para pensar nisso? Aquele final era todo uma carta de amor de seus criadores, era passional e sensível como é o coração de qualquer fã. Era um final sem cinismo, sem frieza, era um final tomado de afeto e de admiração… Me desculpem se parece tolo para alguns de vocês, mas Lost foi especial demais até pra quem a escrevia e isso… Isso é parte de uma mágica que pra mim só a torna mais grandiosa.
Quando os olhos de Jack se fecharam, o meu peito se invadiu de um orgulho devastador. Por seis anos aquele mundo tinha me desafiado a ser muito mais que um mero espectador. Por seis anos eu fui forçado a muito mais que só assistir… Eu fui respeitado intelectualmente, eu fui levado ao conhecimento de coisas novas e fantásticas… Por seis anos eu fui um louco feliz pulando em frente a TV depois que cada acorde de violoncelo chegava ao ápice, a tela ficava escura e o nome da série espancava aquela escuridão com um baque surdo. Eu sou muito grato por ter vivido aquilo tudo em tempo real… E pode ser que daqui a muito tempo, quando eu não existir mais nesse lugar, eu reencontre alguns amigos numa sala clara de uma esfera superior e que no meio de toda nossa alegria por nos reencontrarmos, um episódio novo de Lost seja exibido pra nós, no intuito de nos fazer reviver a maravilha e o privilégio de ser um fã.
Quero agradecer a todos que acompanharam os textos e pedir desculpas pela demora desse. Acho que pelo tamanho dá bem pra entender porque demorou tanto a sair. Quero que se sintam à vontade pra rebater qualquer argumento e espero que saibam que eu não pretendo dissuadir ninguém de seu ponto de vista, mas apenas mostrar que eu vejo muitas razões para reverenciar esse programa, que pra mim é, e sempre será, uma aula 100% eficaz de como fragmentar uma história, conduzir suas partes, embasá-la com teorias, enriquecer suas bases humanas e torná-la não apenas um fenômeno de faturamento, mas uma obra prima de cultura de mídia.
Lost foi a maior… E eu tenho uma alegria imensa de entendê-la assim.
Antes de ir embora, vamos fazer um apanhado bacana de alguns detalhes que são ótimos, mas que não puderam entrar na análise final.
- Recomendo a todos que assistam os extras da temporada final, que são cheios de momentos comoventes. Além disso, temos a sequência com Hurley e Ben indo buscar Walt, que é apenas bacana, mas não entrega nada de tão eficiente para costurar arestas soltas. Eu demorei muito pra conseguir comprar o BoxSet americano, mas ele vale CADA centavo.
- Matthew Fox passou por uma grande transformação física da primeira temporada para a última. Emagreceu muito e depilou todos os pelos. Sua aparência abatida é notória e em alguns comentários dos extras chegam a fazer piada com a mudança.
- No episódio em que Jack encontra o farol, na sequência de nomes em cada coordenada da bússola gigante, é possível ver o nome de Russeau.
- Muitos se aborreceram para a explicação dada a respeito dos sussurros que se ouviam na floresta. Eu não me importo com a explicação, só acho que ela não precisava ser dada.
- O episódio Across The Sea é o único onde vemos personagens com Mommy Issues ao invés de Daddy Issues.
- A morte de Charles Widmore foi bastante tensa… Ele e a sósia da Tina Fey tiveram um fim seco, frio. Gosto de pensar em Charles como uma cópia quase exata de Ben, com a diferença de que Charles era bem mais charmoso e eficaz com as mulheres.
- ADORO a cena em que ao ser perguntado do motivo de ficar andando pela floresta quando na verdade podia voar, o Homem de Preto responde: “Porque gosto de sentir meus pés no chão”.
- O que dizer de Bernard e Rose?
E por fim, Hurley ganhando o posto de Jack e esperando os poderes: como não amar?
See you in another… whatever, Brothers.
Por: Série Maníacos
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