Basta uma hora de barco de Cartagena das Índias para ver as águas amarronzadas que banham a cidade se transformarem no azul turquesa dos panfletos de viagem. Famosas por oferecerem a verdadeira experiência de Caribe colombiano, as Ilhas do Rosário atraem centenas de turistas em busca das belas paisagens praianas, areias brancas e espreguiçadeira, mas esse não é o único cenário encontrado ali.
Em Isla Grande, a maior das ilhas do Rosário, há uma população nativa de cerca de 800 pessoas. São os descendentes de negros escravizados que ocuparam a região há séculos e desenvolveram maneiras particulares de se relacionarem com a terra. Hoje, eles lutam pelo reconhecimento do direito de ocupação do território como uma comunidade tradicional. Orika, a única vila da ilha, tem poucas casas – muitas delas de madeira -, ruas de terra e cerca de 200 habitantes.
“Orika era a filha de Benco Viejo, um herói que lutou pela liberdade do povo negro”, conta Yasmin. “Nós somos todos seus filhos, porque somos os negros que vieram para cá em busca dessa liberdade”. Ela segura nos braços a filha Maitê enquanto explica que faz parte de uma cooperativa de mulheres artesãs. Tudo o que ganham com a venda de artesanato e bijuterias é dividido igualmente entre as 10 participantes. “Vivemos do turismo”, diz.
Yasmin e sua filha Maitê
O setor de turismo é o principal motor da economia de Isla Grande. Mas embora turistas de todas as partes do mundo cheguem todos os dias nas dezenas de barcos que deixam o porto de Cartagena, a pequena comunidade vive esquecida. Na alta temporada, a população local chega a subir para duas mil pessoas.
Localizada no centro da ilha, a alguns minutos de caminhada das praias mais próximas, por trajetos que passam por trilhas não muito bem demarcadas, não são muitos os visitantes que trocam o dia nas águas azuis do Caribe por um passeio pela comunidade na qual não há outro atrativo que não o humano.
“Passamos o dia de ontem apagando um incêndio”, me contou Ramiro, dono de uma das poucas pousadas localizadas dentro da comunidade, no dia em que cheguei. “Começou em uma casa e se espalhou rapidamente, então todos tivemos que ajudar a conter o fogo”. Ele explica que nas Ilhas do Rosário não há corpo de bombeiros nem Polícia Nacional, por isso os habitantes dali precisam se virar para lidar com esse tipo de incidente.
E esse não é o único recurso que falta por ali. A maior parte dos suprimentos que abastece a ilha vem de barco de Cartagena a cada 15 dias e acaba nos hotéis e resorts – são 12 propriedades no total – onde são vendidos aos turistas por preços consideravelmente mais caros que no continente. E a falta de pelo menos um item essencial é bastante sentida: água. Por ser uma ilha, o recurso já é naturalmente escasso. Mesmo nos hotéis, o consumo é controlado e só é liberado em determinados momentos do dia.
Para a população, o acesso é ainda mais complicado. É preciso enfrentar fila para encher galões nos poços artesianos, mas a água retirada deles não é potável e precisa ser fervida antes do consumo. Como o preço do refrigerante – a preferência local é pela marca Kola Román – é mais baixo que o da água mineral, essa acaba sendo a alternativa mais utilizada para matar a sede por ali.
Nas noites de sexta e sábado, a música ressoa alta na copa das árvores que rodeiam Orika. É apenas nesses dias que a legislação ambiental permite festa e os bares e casas de baile garantem que tudo será curtido no último volume, ainda que apenas uns gatos pingados se espalhem pelos dois ou três estabelecimentos que competem pela música. Um cenário bastante diferente das festas encontradas nas praias e nas lanchas que fazem o trajeto rumo às ilhas vizinhas e nas quais os visitantes podem chegar a gastar pequenas fortunas em pesos colombianos por noite.
Mas nos demais dias, impera o silêncio. Crianças andam pelas ruas de terra com suas bicicletas e brincam nos parquinhos. Mulheres vêem a vida passar por trás das janelas e sorriem para quem encontram. Cabras, porcos e galinhas descansam na sombra das árvores. É assim que a vida em Orika segue pacata e alheia a badalação cosmopolita das praias de acesso restrito controlado pelos hotéis e Beach Clubs. Dois mundos paralelos que dividem aqueles 0,2 quilômetros quadrados de ilha, mas só se encontram no estritamente necessário.
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Por: 360meridianos
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