Eu, você e todo mundo que lê esse blog e viaja, cumpre o seu papel de turista no país dos outros. De uns tempos para cá, tem gente que gosta de diferenciar turistas de viajantes, mas se você lê esse blog há algum tempo já sabe que nós achamos essa diferenciação uma bobagem. Mas existe um motivo para o termo turista ter ganhado essa carga negativa e esse motivo é o comportamento das pessoas.
E é o comportamento de todas as pessoas que viajam. Os seres humanos têm uma tendência meio absurda de repetir coisas que os outros fazem sem pensar e de repente, tá todo mundo fazendo a mesma cagada repetida e aquele absurdo vira tradição.
E algumas dessas coisas são completamente evitáveis. Se, ao invés de fazer como todo mundo, a gente parasse por cinco minutos e refletisse: “será que realmente vale a pena fazer isso?” esse post não teria razão de existir. Por isso fiz questão de colocar bem claras as situações de que sou culpada das atitudes que estou condenando. Porque acredito sinceramente que devemos aprender com os nossos erros e lutar para que não façamos nada disso novamente.
Colocar cadeados em pontes
Crédito: Inocybe/Piero d’Houin, Wikimedia Commons
Eu não sei quem foi a primeira pessoa a ter a ideia de jerico de colocar cadeado numa ponte para representar o amor do casal (segundo a Wikipedia, é uma história de 100 anos atrás de um soldado da primeira guerra mundial), mas fato é que a Ponte das Artes, em Paris, já sofreu com 45 toneladas de cadeados acumulados, correndo o risco de colapsar com tanto peso. Até hoje, a prefeitura tenta dar um jeito de solucionar o problema, colocando tapume e dando multa, mas a galera continua insistindo. Um exemplo é essa querida pessoa que deu entrevista em junho de 2015 à Reuters TV: “Nós viemos com a ideia de colocar um cadeado, mas descobrimos que está fechado e agora é ilegal, por isso nós vamos prendê-lo aqui no final da ponte para que ninguém possa ver”.
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Não bastasse a moda em Paris, o povo passou a querer colocar cadeado em qualquer ponte bonita. Em Veneza, a multa para quem tenta fazer essas gracinhas pode chegar a 3000 euros. Então, vamos lá gente: seu amor precisa mesmo ser expresso nesse cadeado? Pare e pense: centenas de cadeados ali ajudam a corroer (graças a oxidação mais rápida) uma estrutura de metal centenária. Além disso, o peso dos cadeados afeta as estruturas e leva a risco de desabamentos. Vamos ser românticos sem estragar a ponte alheia, que tal?
Tirar foto com flash em museus e exposições
Eu queria entender as pessoas, mas as pessoas são incompreensíveis às vezes. Tem uma centena de placas falando: sem flash! Tem desenhos avisando que não pode usar o flash. Tem funcionários que ficam de olho gritando: no flash. E ainda assim, sempre tem aqueles que vão lá e ligam aquela luz florescente do capeta numa pintura de 200 anos.
Eu tenho vontade de dar a mão para a pessoa e cantar para ela: Nãaaaaaao use o flaaaaash peloamordedeusssss (adicione aqui um ritmo a sua escolha).
Turistas e viajantes desse mundão sem porteira: mantenha seu flash desligado e não seja uma dessas pessoas que se não se importam em destruir uma obra de arte secular ou um artefato milenar, seja por distração, seja por querer uma luz extra para compor a foto. Apenas parem.
Subir em coisas* para tirar fotos
Estava lá eu caminhando pela exageradamente lotada Ponte Charles em Praga. Não vi uns casais obcecados por cadeados do primeiro tópico, mas vi gente tentando subir na estátua para tirar selfie. E sim, eu sei que aparentemente parece uma boa ideia você montar num elefante de mil anos atrás porque talvez vá gerar uma foto muito boa. Mas vai por mim:
NÃO É UMA BOA IDEIA
Por *coisas você pode entender qualquer estátua, monumento, estrutura arquitetônica, etc. É uma péssima ideia, que se a gente gastar míseros três segundos refletindo a respeito, vai chegar sempre a mesma conclusão. Esse é o grande ponto desse post. Quando você sai de casa todos os dias você faz escolhas e usa seu bom senso. Você provavelmente não chega no seu trabalho e coloca o pé na mesa do seu chefe, sei lá. Porque será então que a gente usa a empolgação do momento como uma desculpa para fazer umas burrices dessas?
Potencialmente destruir uma estátua ou monumento só porque isso vai render uma boa foto: não é legal e não vale a pena.
Atrações com animais em geral
Nem toda atração com animais é anti-ética ou causa maus tratos ao bichinhos. Mas como você vai saber disso? Pesquisando antes. O mundo contemporâneo criou essa coisa maravilhosa chamada Google que nos permite saber exatamente onde estamos nos metendo antes de ir. Nós temos um post inteirinho só para te contar como decidir se aquele seu contato com um bichinho será uma atitude sustentável ou completamente idiota da sua parte.
Eu digo idiota porque eu sou completamente culpada de já ter feito essas coisas e tenho vontade de me esconder embaixo da areia de me lembrar. Sim, amamos os animais e temos essa curiosidade tremenda de vê-los de perto, talvez poder tocá-los. Mas se você realmente ama os animais, vai achar mais importante respeitá-los ao invés de transformar suas vidas em atração turística.
Fazer passeios estilo “zoológico humano”
A curiosidade humana somada à total falta de empatia pode gerar comportamentos absurdos. Isso significa que transformamos culturas, hábitos de vida e até sofrimento e pobreza em atração turística. O problema é que tem um monte de gente, eu incluída, que participa desse comportamento absurdo sem pensar.
Foi isso que aconteceu quando eu voltei da Tailândia e fui pesquisar para escrever sobre as mulheres girafa. E descobri uma história de horror fantasiada de tour. Ou o que acontece com a Tribo dos Jarawa, na Índia. Ou como é bizarro os tours em favelas, seja no Rio de Janeiro ou na África do Sul.
Antes que vocês pensem em dizer: “ah, mas os turistas ajudam eles a sobreviver”, pare e pense. Se uma atração ou tour depende da pobreza ou sofrimento alheio para se manter, não importa o tamanho da renda que ela gera para aquela comunidade, esse não é o tipo de atração que deveria existir. A gente só combate esse tipo de comportamento com informação e reflexão. Bora colocar isso para funcionar na hora de planejar as próximas viagens.
Não levar artefatos históricos ou coisas naturais como suvenir
Em junho desse ano, adolescentes foram presos por roubar itens de Auschwitz. Tomaram uma bela multa e passaram um tempo na prisão. Não foi só uma coisa de adolescentes. De pedaços de mármore e mosaicos em Roma a pequenas estátuas e pedras em templo do Sudeste Asiático, tem gente que acha que precisa de um suvenir a qualquer custo. Dessa lista, essa é a única opção que envolve 100% de más intenções. Não tem como uma pessoa pegar um objeto num local histórico, por menor ou mais inocente que pareça, colocar na bolsa e achar que está tudo bem.
Mas tem uma coisa que muita gente faz sem saber que é errado. E esse recado é para quem pega coisas em ambientes naturais. Estou aqui apostando na inocência de turistas e não em gente que faz tráfico internacional de fauna ou flora. Muitas vezes é errado pegar coisas simples, como pedras, flores e até mesmo areia, porque isso pode afetar algum ecossistema muito delicado (sem contar que pode afetar também o ecossistema do seu país, na volta). Até mesmo o famoso ato de catar conchinhas na praia é muito prejudicial para os pequenos animais que vivem ali, você sabia? Pois é, taí mais uma coisa que nós turistas fazem sem pensar e deveríamos parar.
Tratar celebrações religiosas como espetáculo ou com desrespeito
Você não precisa ter religião nenhuma para saber que deveria respeitar a dos outros. Principalmente se você está no país dos outros, visitando um local de oração deles. O problema começa na vestimenta e termina… ih, não termina nunca. Eu desconheço uma igreja ou templo de qualquer religião que não tenha um código de vestimenta e conduta. Eu preciso concordar com isso? Não, na minha vida posso e devo questionar qualquer coisa. Porém, se eu quero visitar dito templo, o mínimo que eu preciso fazer é respeitar as regras. Basicamente, você está entrando mais do que na casa dos outros, está entrando num lugar que eles consideram sagrado. Não, você não pode se comportar como bem entender, seja lá por qual motivo.
As coisas escalam fácil a partir dai. Recomendo, por exemplo, a reflexão que a Camila Navarro, do Viaggiando, fez sobre como nós turistas transformamos algo mágico como a Ronda das Almas em Luang Prabang numa cena de paparazzis, com flash para todos os lados e pessoas transformando um ritual religioso num espetáculo. Falta respeito, muito respeito. E as pessoas nem param para pensar sobre isso. Só querem conseguir a melhor foto.
Por falar em foto, tem gente que acha legal ficar pelado em templos para tirar uma foto engraçadinha #soquenão. Sério, não to inventando. A questão é, mesmo que você não saiba nada sobre aquela religião, ou não entenda lhufas do significado de um ritual, pare, escute, respeite e aprenda.
Enfim, o ponto desse post é dizer: Não é porque você é turista que tem o direito de agir como bem entende. E mesmo a sua atitude mais inocente pode ser ofensiva ou destrutiva. Olha o meu sorrisão naquelas fotos fazendo tudo errado. Bom senso, respeito e reflexão fazem bem para qualquer pessoa. Para viajantes, isso é mais do que imprescindível.
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Por: 360meridianos
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