O sobrenome é Rayburn, mas podia ser Negação.
Bloodline é uma série sem pressa e para ser um espectador feliz, é preciso admirar isso. Ao mesmo tempo que não considero a série binge-watching worthy a ponto de abdicar de vida social como uma House of Cards é capaz de fazer, ter a temporada inteira disponível a favorece muito. Graças a esse ritmo mais lento, uma semana entre episódios talvez desmotivasse parte da audiência de acompanhar a série, por isso Bloodline é perfeita para o modelo Netflix. Confesso que a fórmula de se apoiar em cliffhangers nos momentos finais dos episódios me enerva um pouco. É uma estratégia rasa e desnecessária, pelo menos pra mim, que me prendo a série pelo seu tão familiar tema (trocadilho não intencional) e desenvolvimento das infinitas camadas de cada um de seus personagens. Esse sim é o verdadeiro trunfo de Bloodline e o que me prende entre um play e outro.
Se sua família é digna de um comercial de margarina, parabéns pra você. Mas é importante lembrar que família nem sempre é sinônimo de união de gente que se ama e se respeita, nossas manchetes estão cheias de exemplos que comprovam isso. É claro que não existe só o 8 e o 80, famílias Doriana ou Richthofen. E até assistir mais alguns episódios e saber exatamente como Danny fez seu último check-out, não dá pra saber onde os Rayburns se encaixam nessa escala. Se o passado ainda não está claro, quem dirá o futuro.
Tanto os Rayburn e qualquer outra família estão sujeitos a uma mesma verdade: por bem ou por mal, eles estão conectados por toda a vida, nem que apenas por uma sequência de DNA. Subornar o filho para nunca mais vê-lo não fará com que Robert se livre de Danny, mesmo que ele fosse sim embora e cumprisse sua promessa de nunca mais voltar. Os sentimentos, traumas, memórias e afins provocados pelo filho, não iriam com ele.
Por mais que eu tenha uma queda por John por motivo de: Kyle-Chandler-amor-eterno-amor-verdadeiro, é Danny que me hipnotizou desde o primeiro instante. Ele se revela por ângulos tão diferentes e sabe explorar sabiamente tantas nuances, que você ao mesmo tempo que quer acreditar que ele tem algo de bom e portanto, salvação, tem medo de o fazer, porque ele também mostra um conformismo diante do acúmulo de cagadas ao longo da vida, como se ele estivesse predestinado a estragar tudo, como se ele nao soubesse fazer outra coisa senão merda. Ele sabe ser ruim sim, ô se sabe, mas fica a impressão de que isso é um mecanismo de defesa e/ou sobrevivência.
No fim, a gente sabe, e ele também, o que é certo e o que é errado. Seja qual for a imagem que você criou de Danny até aqui, acho impossível não sentir empatia pelo personagem. A própria família oscila entre o otimismo receoso e o cinismo extremo ao tratar de Danny, por que não faríamos o mesmo?
O quarto episódio é pano de fundo para mostrar a ligação entre os corpos e o serviço prestado por Eric O’Bannon com a ajuda de Danny. Se O’Bannon sabe exatamente pra onde vai a gasolina roubada, eu não sei, mas ele sabe que pra coisa boa não era. Danny idem. Ele pode fazer sem pensar, mas ele não é tão burro a ponto de ser cego. Agora é esperar o desenvolvimento dessa investigação e até onde o envolvimento de Danny nisso é uma das causas de sua morte.
A única coisa que me incomodou nesse ao longo desses 50 minutos foi a mudança de comportamento pra lá de brusca de Kevin que até o terceiro episódio é o mais anti-Danny da família e agora está 100% convertido. Ok, tá bom, vamos aceitar que relação de irmãos tem dessas mesmo, bro-code, e que o pobre está desesperado por uma distração do seu eminente divórcio. Eu até aceito, mas que forçou, forçou.
Esse capítulo se diferencia um pouco dos três últimos por não ter a narração de John e não mostrar flashfowards. Em vez disso, ganham destaque as memórias de Robert, o divo Sam Shepard, que ownou ao interpretar o patriarca se recuperando do derrame e sendo perseguido por lembranças de Sarah. Ainda não sabemos como Danny está envolvido na morte da irmã, mas ficou a impressão de que, por mais acidental que pareça ter sido, Papa Ray culpa o primogênito pelo afogamento de sua filha mais velha e esses demônios os perturbam mais com a proximidade do filho. O que Danny pode ter feito para que nem salvar a vida do pai o faça cair em suas boas graças novamente? Ou no mínimo ganhar uma nova chance? Afinal, é de redenção que Danny está atrás. O embate entre os dois foi nada menos que bri-lha-nte, foi lindo assistir aquele sentimento que beirava a superfície mas nunca transbordava até o olho do outro. A negação em que os Rayburn vivem é sufocante, mas está prestes a ter vazão.
Meg nega o fracasso de seu relacionamento de fachada, Kevin nega seu divórcio, Sally nega a possibilidade da morte iminente de seu marido, Robert nega que a decisão de mandar o filho embora é pura e unicamente egoísta, nega até assumir a decisão já tomada no testamento. John nega a responsabilidade da decisão em mandar o irmão embora anteriormente, a covardia parece imperar naquela família. Ninguém põe os pontos nos is e quando o faz é estrategicamente para poucos, com a finalidade máxima de manter as aparências, seja a aparência de bom, justo, bem sucedido ou feliz. E tudo para manter um bom status dentro de sua família. É como se eles vivessem mesmo numa ilha, mas muito, muito menor, habitada apenas por Rayburns, já que só a opinião deles parece importar.
Por: Série Maníacos
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