Atentados em Bruxelas: por que não desmarquei minha viagem
Eu já tinha minha terça-feira toda planejada. Fui à médica cedo, depois iria passar o dia na biblioteca escrevendo para minha dissertação. Mas enquanto estava na sala de espera, olhando desatentamente meu feed de notícias, um comentário me chamou a atenção: alguém mencionava alguma coisa sobre atentados em Bruxelas. Corri para a melhor fonte de informações instantâneas da internet, o Twitter, e lá já descobri que não só havia explodido uma bomba no salão de embarque do Aeroporto de Bruxelas, como surgiam as primeiras notícias sobre a explosão na estação de metrô Maelbeek.
Senti meu estômago cair no chão enquanto lia os poucos relatos até então sobre mortos e feridos. Já se desconfiava, e mais tarde veio a confirmação, de que os ataques estavam relacionados de certa forma com a prisão do responsável pelo terror em Paris, em novembro. Na cabeça não saia o pensamento: “Poderia ter sido eu”.
Sim, porque a minha passagem para Bruxelas estava comprada. Eu embarcaria no domingo bem cedo para passar 3 dias da cidade. Já tinha comemorado esse mini descanso na nossa newsletter. De repente, a viagem, motivo de alegria, parecia ficar nebulosa.
O que fazer nessas horas? Enquanto eu lia compulsivamente sobre os atentados, começaram a chegar as primeiras mensagens de amigos e família que lembravam que eu iria para Bruxelas, mas não tinham certeza se eu já estava lá ou não. “Vocês não vão mais ir, né?” foi uma pergunta que rolou.
Difícil responder. Logo eu, que ano passado zuei muito o meu primo, que, desavisado, foi para Bruxelas bem no dia da ação policial que parou toda a cidade. Tudo fechado, nada funcionando. Para mim, agora, além do medo de novos atentados, também havia o medo de que fosse estar tudo fechado, parado. Como eu não ia sozinha, sentei para conversar sobre o que faríamos. Resolvemos ficar ligados nas notícias até sábado, mas não desistir da viagem.
A Naty já escreveu um post que resume bem a minha vontade de não desistir, mas vou repetir aqui: em primeiro lugar, dificilmente existem dois atentados seguidos, em datas tão próximas, numa mesma cidade. O policiamento é reforçado, aumenta o cerco contra os terroristas e, além disso, uma violência assim, dessa magnitude, não é planejada da noite para o dia.
E se pensarmos nos objetivos do terrorismo, eles são exatamente gerar medo e afastar as pessoas do lugar. E uma das nossas formas de lutar contra isso no mundo é não cortar uma cidade da lista de passeios porque ela sofreu um atentado. Foi assim com a Naty em Istambul, em fevereiro, e assim comigo em Bruxelas, em março.
E por fim, infelizmente, há uma certa inevitabilidade na vida. Às vezes, estaremos na hora errada e no lugar errado. Espero que eu nunca dê esse azar. Mas se eu for pensar em questão de probabilidade, dependendo de onde eu estiver no Brasil corro tantos riscos quanto em cidades europeias ameaçadas por terrorismo.
Claro, podemos tentar nos proteger. Nós, por exemplo, por conta da localização do flat alugado em Bruxelas, decidimos não pegar metrô: andamos muito a pé e, quando necessário, de ônibus. O que foi uma boa decisão, uma vez que os horários de funcionamento dos transportes ainda estavam meio confusos.
Homenagens em frente ao Place de la Bourse
Boulevard Anspach com trânsito fechado para carros
Exército reforçando a segurança na região do Parlamento Europeu
Felizmente, dessa vez, não rolou o tal “lockdown“. Está tudo aberto e funcionando por lá – com exceção de algumas estações de metrô e da avenida que dá acesso ao Place de la Bourse, onde está o maior memorial às vítimas. A vida segue na cidade. Atrações turísticas estão abertas, as pessoas estão nas ruas, tomando cerveja nos bares, comendo suas batatas fritas e seguindo suas vidas.
Conversei com minha amiga belga (ela não mora em Bruxelas, mas a irmã dela sim) e também com o cara que nos recebeu via Airbnb. Estavam muito tristes com o que aconteceu, mas também com a sensação de que não queriam se deixar levar por isso. Bruxelas é uma cidade linda, das mais lindas que já visitei. Muito diversa também.
Tive a chance de circular em diferentes bairros e ir além só do centrinho turístico: ouvi diversas línguas, cores, credos, estilos. Sei que muito do terrorismo se alimenta dessas diferenças – e o preconceito contra elas – para ganhar terreno. Ainda assim, torço para que momentos como esse, de alguma forma, nos tragam forças e muita reflexão para que haja menos medo e menos preconceitos. Só assim o terrorismo perde.
Se você, como eu, está se perguntando se deve ou não ir a Bruxelas por agora, fica aqui minha reflexão. Passei três dias incríveis na cidade e, mesmo neste momento delicado, fiquei feliz em não ter me rendido ao medo e desistido da viagem. É uma decisão pessoal e cada um sabe de si.
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