Eu estava em uma cidade minúscula, cercada por montanhas coloridas, no norte da Argentina. A paisagem era linda e a viagem era a realização de uma vontade antiga. Eu estava feliz por estar ali, mas, por algum motivo, eu não estava ali por completo.
Horas antes, meu celular tocou com uma notificação. Eram fotos dos meus amigos reunidos. Eles estavam felizes, se divertindo, e eu estava longe. E, como eu estou longe frequentemente, eu acabo perdendo vários desses eventos. Mas eu queria fazer parte daquilo, uma pontinha de inveja veio manchar meu humor naquele dia. “Será que minha ausência constante vai acabar me afastando do grupo?”. Eu queria estar em casa. Na verdade, em queria estar em dois lugares ao mesmo tempo.
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Depois de meses de estrada, eu estava em casa. Aquilo era um alívio. Eu finalmente tinha a chance de me encontrar com meus amigos nos finais de semana, participar das festas de família, me jogar de pijama no sofá e assistir a uma maratona da minha série preferida.
E era exatamente isso que eu tinha programado para aquela noite, quando eu resolvo, entre um episódio e outro, atualizar meu feed do Instagram só para constatar que eu parecia ser a única pessoa do mundo a usar um pijama velho numa noite de sexta. Minha sala foi subitamente inundada por fotos de festas, bares descolados, baladas e restaurantes famosos.
Ugh, porque eu resolvi “ficar em casa” e “organizar” minha “vida”?
E, como eu sigo muita gente que viaja bastante, entre uma imagem e outra, lá estavam elas, as fotos da estrada. Caramba, como eu sinto falta disso! Explorar lugares incríveis, viver situações empolgantes, descobrir coisas novas. Eu queria estar viajando.
Eu queria ter tido mais ânimo para me arrumar e ver aquele novo lugar famoso na minha cidade, ter visitado aquela exposição, ter ido naquele show legal que eu disse que iria durante toda a semana. Na verdade, eu queria estar em todos os lugares ao mesmo tempo.
Não se pode ter tudo
Cada geração tem seus próprios problemas e a nossa é profundamente afetada por particularidades da era digital. Os planos de internet para celular potencializaram um fenômeno que pode nem ser tão novo assim, mas que agora se espalhou como uma epidemia para desencadear quadros de ansiedade e bagunçar nossa saúde mental.
O compartilhamento em tempo real jogou na nossa cara o que todo mundo já sabia, mas antes não conseguia mensurar tão bem: tudo acontece o tempo inteiro em todos os lugares e nós não conseguimos fazer parte disso. Por mais que a gente não goste, sempre vamos perder alguma coisa.
Não se divirtam sem mim
E não precisa ser apenas a invejinha branca que surge quando alguém está fazendo algo mais legal que você. O FOMO surge também naqueles momentos em que a gente não consegue parar de atualizar o feed de notícias para ver se alguma coisa grande aconteceu no mundo e a gente não está sabendo. Ou se algum grande meme que todos começaram a usar surgiu nos últimos cinco minutos. Afinal, ninguém quer ficar de fora das piadas.
De acordo com uma pesquisa da JWT, 70% dos jovens da geração Y (quem nasceu a partir de 1980) relatou que já sofreu com esse fenômeno em algum grau. Além disso, 52% disse se sentir por fora no Facebook e 43% acredita que as mídias sociais contribuem para intensificar o FOMO.
Sim, eu sofro com o FOMO, ou Fear of Missing Out (medo de estar por fora). E acho que admitir isso é meio caminho andado para resolver o problema. Repita você também, se for caso: “Eu tenho medo de estar por fora ou de desperdiçar minha vida de forma medíocre enquanto todo mundo está por aí esfregando dias descolados e grandes realizações na minha cara”. Alguém mais está se sentindo melhor? Ótimo, agora é hora de desconstruir esse problema.
Em um dos episódios de How I Met Your Mother que eu assisti naquela sexta-feira do pijama, os protagonistas Ted e Marshall se lembram de Blitz, um amigo de faculdade que era amaldiçoado. Segundo eles, toda vez que ele ia embora, algo incrível acontecia. Se ele saia de um bar, em seguida rolava uma rodada de bebida grátis para todos. Era dizer tchau para o grupo de amigos que aparecia alguém famoso que todos adoravam. De alguma forma, as histórias sempre pareciam acontecer na ausência de Blitz.
Acho que todo mundo já se sentiu meio Blitz alguma vez. Quem nunca pensou: “Poxa, não acredito que eu perdi essa!”, que atire a primeira pedra. O problema é que agora esses momentos parecem ter se multiplicado e intensificado porque todo mundo está, o tempo inteiro, compartilhando dezenas de fotos das horas mais legais da vida.
Nossos avatares digitais são versões idealizadas de nós mesmos. Nós temos a tendência de só expor na rede recortes que corroborem a imagem que a gente que quer as pessoas tenham da gente. Por isso que todo mundo parece tão descolado, antenado, talentoso e bem sucedido na sua timeline. Mas o mais importante é saber que ninguém é aquela pessoa que está em todos o lugares, o tempo inteiro, fazendo coisas invejáveis 24h por dia (imaginem a canseira?).
E isso é meio óbvio, não é? De acordo com a mesma pesquisa da JWT, 80% das pessoas reconhecem que as redes são um espaço propício para quem quer se gabar da própria vida. Difícil é racionalizar assim na hora que o FOMO te espreitar pela janela do navegador.
Nessa era em que somos constantemente inundados por informações de todos os cantos, que somos cobrados pela nossa presença digital e que temos que ficar ligados o tempo inteiro, o FOMO não tem dado sinais de desaparecer. O jeito, então, é aprender a conviver com ele. Ignorar os sussurros do medo dizendo que sua vida é lama, ou a vozinha irritante que diz que tem algo muito importante acontecendo no Facebook agora mesmo.
É aprender a dizer “Não me importa, FOMO, hoje eu só vou me sentar aqui com minha série e meu pote de sorvete e vai ser uma noite incrível.” e “Saia daqui, eu estou feliz com o que eu tenho para hoje”. Ou, por mais difícil que pareça, aprender a desconectar só um pouquinho para viver só um momento de cada vez.
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Por: 360meridianos
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