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Meu problema com a nostalgia

Eu me programei para escrever este texto há algumas semanas, motivada por postagens em redes sociais de pessoas que eu conheço. Primeiro, um amigo postou uma foto de 2007 falando da nostalgia daqueles tempos, que eram bons e não voltam nunca mais (a referência musical é por minha conta 🙂 ).

Não que seja algo muito impactante, mas de vez em quando fotos assim me deixam com uma sensação estranha. Explico: adoro rever fotos de viagens antigas, fotos de festas antigas. Volta e meia me pego revendo algumas das mais de 10000 fotos que tirei na Volta ao Mundo – e nunca consegui me organizar para selecionar algumas e fazer um álbum decente. Porém, eu não consigo sentir nostalgia com aquilo. Sinto saudades de pessoas, sinto vontade de voltar a lugares que já conheci e adorei. Mas de forma alguma tenho vontade de voltar no tempo.

Para entender melhor meu problema com a nostalgia, vejamos a definição do termo, segundo nossa amiga Wikipedia:

“Nostalgia é um termo que descreve uma sensação de saudade idealizada, e às vezes irreal, por momentos vividos no passado associada com um desejo sentimental de regresso impulsionado por lembranças de momentos felizes e antigas relações sociais. A palavra vem do grego νόστος (nóstos – “reencontro”) e ἄλγος (álgos – “dor, sofrimento”). A nostalgia já foi considerada uma condição médica no início da Era Moderna por ser associada com a melancolia, além de ser importante na literatura como um frequente tropo no Romantismo.

A nostalgia é diferente da saudade, pois a última (saudade) é direcionada a um alvo ou momento específico e até pode ser superada pela presença ou repetição. Já a nostalgia não pode ser superada no campo físico, pois diz respeito somente a uma visão idealizada de passado que cada um possui.”

Pokhara - Nepal

Vendo o nascer do sol no Nepal, em 2012

Eu já até tinha comentado sobre isso naquela minha reflexão sobre os ciclos de sete anos, que até nostalgia alheia me incomodava. E incomoda mesmo, porque como vocês podem ver pela maravilhosa definição acima, nostalgia é “saudade idealizada”, ou, ainda, saudade seletiva. Uma melancolia que deixa as pessoas presas no passado e meio que impede a evolução.

Nostalgia pessoal

Num nível pessoal, a nostalgia me incomoda muito porque eu sou uma pessoa que gosta de aprender com o passado e presente, mas projetar isso para as possibilidades do futuro. Tenho verdadeiro pavor de ficar presa a ideias cristalizadas, a sensações que já aconteceram e já passaram.

Eu costumo me arrepender só de coisas que eu não fiz por falta de coragem. Mas não consigo ver um tempo em que as coisas eram tão mais fáceis assim ou mais simples. A vida é sempre uma montanha-russa e às vezes coisas muito, muito ruins, acontecem, não tem como fugir. A gente tem é que dar um jeito de aprender com isso, superar e seguir em frente.

Harvard, Boston - EUA

Meu primeiro intercâmbio para os Estados Unidos, em 2008

Então, eu acho que é compreensível sentir saudades de pessoas, lugares e situações. Mas eu não entendo ser nostálgico, porque essa visão idealizada de um passado é prejudicial.

Nostalgia Social

Principalmente se a gente sai do nível pessoal e passa para o nível social. A outra postagem que me fez pensar em escrever este texto foi a reflexão que uma professora de faculdade, a Silvia Amélia de Araújo (recomendo até seguir ela no Facebook), fez sobre nostalgia. Ela comentou que, quando era criança, ficava pensando quando ia chegar o ponto na cabeça dela que ia ficar querendo que as coisas voltassem a ser como no passado, igual as pessoas mais velhas faziam. Ela, como eu, ainda não chegou nesse ponto e espera que nunca chegue.

Por quê? Bem, porque a realidade é que o passado pode até ter coisas boas, como sei lá, menos violência urbana e menos textões nas redes sociais, mas, sinceramente, por pior que esteja a nossa sociedade, esse é o ápice da evolução que já chegamos em termos de cidadania e direitos. Para começar, ser mulher, ser negro ou ser gay antigamente era um horror muito maior do que é hoje. E há 50 anos, eu nem poderia sonhar em levar o estilo de vida que eu levo hoje.

Luiza no Castelo de Tomar Portugal

No início do meu mestrado em Portugal, em 2014

O problema é que não há direito adquirido que não possa ser perdido – esse é exatamente o meu medo com a nostalgia. Toda essa retomada de pensamentos de extremistas, de gente falando em voltar com a ditadura no Brasil, de gente falando em fazer a “America” ou a “Britain” great again, não me tira da cabeça que tem a ver com nostalgia. Alguém conhece um estudo sobre isso? Se sim, me manda o link, por favor.

Leia também: O que a gente tem a ver com a saída do Reino Unido da União Européia?

Tanto acho isso, que nesse referendo do Reino Unido, uma da grandes discussões pós voto para sair é que 73% dos jovens com menos de 25 anos votaram para ficar na União Europeia (quem tinha 16 e 17 anos não pode votar) e 60% dos idosos com mais de 65 anos votaram para sair dela.

Os jovens estão revoltados, dizem que as pessoas mais velhas tiraram deles as oportunidades de futuro. E algumas dessas pessoas mais velhas estão comemorando que agora eles vão poder “voltar ao que era antes”. Números são muito mais complexos do que isso, mas eu entendo o sentimento.

O problema, acredito eu, assim como uma propaganda política que só mostra um lado da moeda, é que a nostalgia é o tipo do sensação que faz as pessoas olharem para um período do tempo com um poderoso filtro que as impede de refletir realmente sobre as coisas boas e más que aconteceram. Nada, absolutamente nada, foi somente bom. E pensar assim não é só romantizado, é perigoso mesmo.

*A imagem destacada é uma foto de uma exposição de 2013 na East Side Gallery, no antigo muro de Berlim, sobre muros que dividem o mundo.

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Por: 360meridianos

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