O sol nem nasceu e já tem gente indo trabalhar, numa estrada de terra daquelas que levantam poeira vermelha, de carro, de moto, de jegue, a pé. As imagens vão me acompanhando ao longo do dia que vai nascendo, com registros do calor que não para de aumentar.
Imagens de um Brasil tradicional. Palavras de homens e mulheres que vivem ali. Quem virou sanfoneiro, quem é devoto do santo tal. O dia termina num animado forró, quando a temperatura já começava a diminuir um pouco, mas a animação das pessoas só acaba quase na hora do dia raiar.
E assim é o ciclo da vida no sertão, pelo menos aquele apresentado logo na entrada do Museu Cais do Sertão, numa enorme sala circular, onde o vídeo te faz sentir dentro da vida daquelas pessoas. O filme Sertão Mundo, do cineasta Marcelo Gomes, foi feito especialmente para a projeção em quatro telas do museu, inclusive o chão.
Após a experiência imersiva, as portas se abrem e um dos educadores avisa: “Cuidado para não caírem no Rio São Francisco”. É que tem um pequeno riacho representando o rio mais importante do sertão, que corta todo o térreo do museu. E é fácil se esquecer que tem um curso d’água por ali, no meio de tanta informação.
O Museu Cais do Sertão é um dos melhores que eu já visitei no Brasil e ganha muitos pontos também entre os que conheci no exterior. Não é à toa, talvez, que a curadoria é da mesma pessoa que montou o Museu da Língua Portuguesa, em São Paulo, a socióloga pernambucana Isa Grinspum Ferraz. Foi construído no lugar de antigos galpões abandonados no Porto de Recife e inaugurado em 2014. Hoje, há planos aprovados para que seja ampliado para além da área de exposições, se tornando um centro cultural.
A verdade é que eu saí dali sentindo que todo brasileiro deveria conhecer o Cais do Sertão, porque uma parte muito importante da nossa história e identidade está ali, mesmo para quem não é nordestino ou nunca pisou nessa região do Brasil. A exposição divide-se em áreas temáticas relacionadas à vida do sertanejo e tendo como linha condutora a obra de Luiz Gonzaga, rei do baião e um dos primeiros artistas a exportar a musicalidade e ruralidade para o resto do Brasil.
Viver, Trabalhar, Cantar, Ocupar, Crer, Migrar e Criar. Sete territórios. Em todos, há uma mistura linda de objetos tradicionais – ferramentas de trabalho, uma casa de barro em tamanho real, vestimentas do cangaço, instrumentos musicais – e telas interativas onde é possível aprender mais sobre as realidades, ver textos, filmes e jogos interativos.
Além disso, os espaços e montagens são lindos, inspiradores e fotogênicos. No território Crer, por exemplo, o Túnel do Capeta, todo feito de espelhos, e o Bosque Santo, com paus-de-sebo pintados a mão, chamam muito a atenção.
Já o primeiro andar (eu acho meio estranha essa coisa de chamar de térreo e primeiro andar, para mim seria segundo piso, mas enfim, vocês entenderam, né?) foca no Migrar, com depoimentos de 48 migrantes sertanejos que ficam se revezando em telas em movimento. As falas vão de ilustres desconhecidos a personalidades como o ex-presidente Lula.
Depois, vem a parte mais divertida do museu Cais do Sertão: uma oficina de instrumentos musicais, onde você pode aprender (brevemente) a tocar sanfona, violino, bumbo e outros instrumentos típicos. Também há cabines para fazer mixagem de som e karaokê, todas com músicas clássicas de Luiz Gonzaga, como Asa Branca, Xote das Meninas e Que Nem Jiló.
Depois de escrever isso, só posso sugerir que vocês escutem essa playlist:
Serviço – Museu Cais do Sertão
O Museu Cais do Sertão fica aberto de terça a domingo, das 10h às 17h. A entrada custa R$10 a inteira e R$5 a meia. Toda quinta-feira a entrada é grátis. É bom checar no Facebook do museu se há alterações nos horários de abertura.
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Por: 360meridianos
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